Fonte: DW
Em Moçambique, o caso das dívidas ocultas, despoletado em 2015, começa a ser julgado na segunda-feira. Analistas, políticos e jornalistas esperam que este julgamento decorra com maior transparência.
Os diversos setores da opinião pública moçambicana querem que o julgamento das dívidas ocultas, que se inicia na segunda-feira (23.08), devolva a boa imagem da Justiça moçambicana. O editor do diário MediaFax, Fernando Mbanze, defende a transparência neste processo.
“Que este processo consiga devolver credibilidade à Justiça moçambicana. Que este processo consiga levar os culpados a devolverem aquilo que tiraram do estado de forma ilícita”, considera.
O diretor do Centro de Integridade Pública (CIP), uma organização que chegou a desencadear uma campanha contra o pagamento das dívidas ocultas, espera que este caso não seja como o “caso Carlos Cardoso”, como diz o diretor da organização, Edson Cortes.
“Que seja um julgamento que o púbico possa assistir e que não aconteça como no caso Carlos Cardoso – em que uma testemunha, quando ia falar algo que todos queríamos saber, foi interrompida. [Este testemunho] começou na sexta-feira e na segunda-feira, quando foi retomado, a testemunha tinha mudado praticamente todo o seu discurso”, recorda.
Entretanto, o editor do MediaFax, Fernando Mbanze, deposita alguma confiança no coletivo de juízes constituído para julgar este caso.
“É importante que acreditemos na administração da Justiça, acreditarmos que o coletivo de juízes que foi colocado para lidar com este caso esteja em altura de levar isto a bom porto”, considera.
Para o deputado da RENAMO, Venâncio Mondlane, que despoletou o caso em 2015 no Parlamento, esta é uma oportunidade para o setor da justiça se redefinir.
“Que o Ministério Público – que tem sido ao longo deste processo todo um descalabro, a peça mais defeituosa, mais ineficiente, mais incompetente, mais inativa e inoperante – que tenha oportunidade de recredibilizar-se neste processo”, critica.
Julgamento complexo
O diretor do CIP reconhece que este caso é muito complexo por causa das personalidades envolvidas e por ser o maior escândalo de corrupção jamais visto em Moçambique, por isso, segundo Edson Cortes, “há uma certa ansiedade sobre como irá decorrer este julgamento e até que ponto as instituições do poder judicial serão imparciais e não se deixarão manipular pelas garras políticas que já conseguimos ou começamos a ver”, afirma.
O deputado Venâncio Mondlane lembra que há algumas figuras políticas importantes que estão envolvidas neste processo e não só, mesmo alguns advogados que assessoraram a fraude que deviam, na sua opinião, ser constituídos arguidos.
“Estou a falar do ex-Presidente da República, Armando Guebuza, do atual Presidente Filipe Nyusi, dos gestores e administradores do Banco de Moçambique, do Tribunal Administrativo, estou a falar da clareza do envolvimento de algumas firmas de advogados de Moçambique que estiveram, desde o início, a assessorar estas empresas”, enumera.
Na lista de tantos outros envolvidos, o editor do MediaFax estranha como o Ministério Público não citou o partido FRELIMO.
“Faz com que realmente algumas expetativas tenham sido infelizmente corroídas. Estou a falar, por exemplo, do partido FRELIMO que recebeu 10 milhões de dólares e devem ser justificados em algum momento. O facto de ter aparecido a FRELIMO, através do seu porta-voz, a dizer que a FRELIMO não conhece o processo desses 10 milhões não significa que o partido não possa ser levado à barra do tribunal, encontrar bons argumentos e explicar o que realmente aconteceu com os 10 milhões de dólares”, critica.
Ao todo, são 19 réus e mais de 50 declarantes num processo que será liderado pelo juiz Efigénio José Batista. O julgamento vai decorrer nas instalações da cadeia de máxima segurança conhecida por B.O., em Maputo.