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Fonte: Notícias
Alguns arguidos arrolados no caso dívidas não declaradas que respondem em juízo, desde segunda-feira, na Cadeia da Máxima Segurança (BO), na Matola, podem não ser condenados se provarem que não estão envolvidos nos crimes que lhes são imputados.
A chefe do Departamento de Assistência Jurídica no Instituto de Patrocínio e Assistência Jurídica (IPAJ), delegação da cidade de Maputo, Laila Garcêz, disse, em declarações ao “Notícias”, que em Direito Penal existe a figura de separação de culpas, que deve ser respeitada.
“Significa que cada réu será responsabilizado pelos crimes que tiver cometido. Nem todos os réus apresentados em juízo terão a mesma pena, pois a culpabilidade de cada um depende do seu envolvimento na prática do delito”, esclareceu.
Acrescentou que, para este caso em concreto, poderá haver casos de arguidos que o tribunal pode ilibar por insuficiência de provas.
O tribunal, tal como referiu, está a ouvir cada arguido de forma extensiva, exercício que visa buscar a verdade material.
“Infelizmente, a sociedade já construiu a sentença deste caso, no sentido de que um determinado réu será condenado porque é culpado, mas a justiça não funciona assim. É preciso haver julgamento e buscar provas suficientes do envolvimento de cada um dos arguidos”, disse.
Garcêz faz balaço positivo dos primeiros cinco dias do julgamento, tendo em conta a forma como está a ser conduzido, as questões prévias levantadas pelos advogados dos réus e pela Ordem dos Advogados de Moçambique (OAM), que provam que o tribunal tem tempo suficiente para julgar o caso.
Pode significar, também, que estão a ser cumpridos, de forma escrupulosa, todos os processos legais. Aos réus, tal como referiu, estáa ser concedido tempo suficiente para apresentarem argumentos em seu benefício.
Garcêz referiu que o horário se tem estendido para além das 21.00 horas, situação que desgasta os réus e outros intervenientes processuais.
Reconheceu que,pela magnitude do processo e com vista a garantir celeridade, este horário é necessário.
“É desgastante para todos os que estão no julgamento, mas é necessário porque a lei indica que a justiça deve ser célere”, sustentou.
Arguido produz prova em sua defesa
Laila Garcêz disse ao “Notícias” que o réu não é obrigado a dizer a verdade em relação aos factos de que é acusado, daí que pode produzir provas em sua própria defesa.
Acrescentou que,em sede das sessões de produção de prova, os arguidos tem a liberdade de apresentar em juízo tudo quanto é necessário em seu benefício.
“A título de exemplo, o arguido Teófilo Nhangumele tenta distanciar-se, em alguns pontos, da relação com Cipriano Mutota e caberá ao tribunal analisar e tomar a decisão”, disse.
Sublinhou que o réu não é obrigado a produzir prova contra si, daí que todos os actos que for a invocar caberá ao juiz apreciar e decidir.
“Quando ele traz aspectos que não estão directamente ligadas ao processo, está a tentar produzir a sua defesa, no sentido de não se incriminar”, indicou.
Lei aplica-se no tempo
A Lei Penal é aplicada ao longo do tempo, o que quer dizer que a partir do momento em que uma norma entra em vigor começa de imediato a ser aplicada, segundo a chefe do Departamento de Assistência Jurídica no Instituto do Patrocínio e Assistência Jurídica (IPAJ),delegação da cidade de Maputo.
Moçambique, tal como indicou, pauta pela aplicação da legalidade, isto é, os arguidos só são considerados culpados por via de uma sentença transitada em julgado, porque antes se presume inocente até àdecisão judicial em contrário.
“Assim, temos de primar pela aplicação da lei no tempo. Em princípio,uma lei que entra em vigor é a que deve ser aplicada, mas tendo em conta os direitos dos arguidos. A Constituição da República prevê que a Lei Penal pode ser aplicada de forma retroactiva se beneficiar o réu”, disse.
A título de exemplo, se o código revogado apresentar matérias favoráveis ao réu, ser-lhe-á aplicada a lei em vigor na altura da prática do crime. Se a lei nova trouxer alguns aspectos positivos que possam beneficiar o arguido,aplicar-se-á esta.
“Percebemos que o processo iniciou na vigência da lei antiga (1929) e vários actos processuais foram praticados na vigência desta norma, como é o caso da instrução do processo e a dedução do próprio caso. Assim, só se pode aplicar esta norma para não quebrar a harmonia dos actos praticados”, disse.
Chang não será julgado neste processo
O antigo ministro das Finanças, Manuel Chang, não será julgado neste processo, sendo que se o tribunal achar necessário poderá abrir um processo independente, constituindo-o arguido.
Segundo Garcêz,quando a Ordem dos Advogados de Moçambique levantou a questão de se ouvir Manuel Chang é na qualidade de declarante,e não como testemunha.
Na verdade, segundo suas palavras, a testemunha é uma pessoa alheia ao processo e só pode ser inquirida por aspectos que conheça e que não tenham interesse directo ao processo.
“Declarante é a pessoa que vai ao tribunal para falar o que sabe. Esta pessoa pode estar directamente envolvida no processo. Se o tribunal se aperceber de que há indícios de este ser ouvido na figura do réu, dever-se-á instaurar um processo autónomo porque em relação a este já se realizaram vários actos, desde a instrução preparatória até ao julgamento. Se um aspecto não consta da acusação, este não pode ser apresentado aos réus na fase dojulgamento. O réu não pode ser surpreendido por factos novos que não constam da acusação”, disse.